segunda-feira, 8 de abril de 2013

DISPENSA DO IPM QUANDO A SINDICÂNCIA JÁ ESCLARECEU O CRIME E AUTORIA

DISPENSA DO INQUÉRITO POLICIAL MILITAR QUANDO O CRIME E SUA AUTORIA JÁ ESTIVEREM ESCLARECIDOS EM SINDICÂNCIA


Cap PM ANTÔNIO ALVES BEZERRA FILHO
*Capitão da Polícia Militar de Pernambuco
* Curso de Formação de Oficiais (APMP/PMPE)
* Bacharel em Direito (Univ. Católica)
* Pós graduado em Direito Público (Univ. Potiguar).
Pós graduando em Ciências Criminais Militares (Faculdade AESO)
  
O vertente trabalho objetiva trazer à baila a discussão acerca da prática corriqueira na Corporação de, ao termo da sindicância, ainda que suficientemente esclarecidos o ilícito penal e a sua autoria, instaurar-se inquérito policial militar para novamente apurar-se os fatos. Dessa incongruência surgiu a idéia de estudar se essa solução é tecnicamente correta ou está colidindo com o princípio Magno da eficiência.

Nesse propósito cabe, inicialmente, ofertar um conceito de inquérito, tarefa que foi desempenhada magistralmente pelo doutrinador Tourinho Filho, para o qual o procedimento constitui um o conjunto de diligências realizadas pela Polícia Judiciária para a apuração de uma infração penal e sua autoria, a fim de que o titular da ação penal possa ingressar em juízo.[1]

A doutrina aponta algumas características desse procedimento, dentre as quais as de ser escrito, sigiloso, inquisitivo, oficial, indisponível e dispensável. Essa última está positivada no art. 28, “a” do Código de Processo Penal Militar, o qual dispõe que o inquérito será dispensado, quando o fato e sua autoria já estiverem esclarecidos por documentos ou outras provas materiais.

O mesmo caminho trilha o art. 33 desse diploma Castrense, porque também atesta a dispensabilidade do inquérito, ao prescrever que qualquer pessoa, no exercício do direito de representação, poderá provocar a iniciativa do Ministério Publico, dando-lhe informações sobre fato que constitua crime militar e sua autoria, e indicando-lhe os elementos de convicção.

Essa realidade é reforçada pelo § 2º do mesmo dispositivo, ao dispor que, se o Ministério Público considerar as informações procedentes, dirigir-se-á à autoridade policial militar para que esta proceda às diligências necessárias ao esclarecimento do fato, instaurando inquérito, se houver motivo para esse fim. Assim, se no caso concreto o representante do Parquet entende ser desnecessária a realização de diligências, ofertará a denúncia com arrimo apenas nas informações prestadas pelo cidadão.

Dessa forma, vê-se que nem sempre o inquérito servirá de fundamento para a promoção da ação penal militar, porquanto tal caderno inquisitorial não é, a rigor, indispensável para a propositura da ação penal, por ser peça meramente informativa.

Essa posição é defendida pela doutrina dominante, como ensina Fernando Capez em lições que, apesar de referirem ao inquérito policial comum, podem ser aplicadas ao Castrense, isso dado ao fato de suas matrizes teóricas serem comuns. O doutrinador assevera que “o inquérito policial não é fase obrigatória da persecução penal, podendo ser dispensado caso o Ministério Público ou o ofendido já disponha de suficientes elementos para a propositura da ação penal”. [2] (grifamos)

A jurisprudência também vem reconhecendo a dispensabilidade, assentando que não é essencial a instauração de inquérito policial ao oferecimento da denúncia, desde que a peça acusatória esteja sustentada por documentos suficientes à caracterização da materialidade do crime e de indícios suficientes de autoria, consoante se infere do julgado abaixo (RTJ, 76/741):
  
O inquérito policial, procedimento administrativo de natureza puramente informativa, não é peça indispensável à promoção da ação penal, exigindo-se tão somente que a denúncia seja embasada em elementos demonstrativos da existência do fato criminoso e de indícios de sua autoria.[3] (grifos nossos)
   
A mesmo solução é dada pela jurisprudência quando os elementos demonstrativos da existência do fato criminoso e de indícios de sua autoria são colhidos no âmbito de sindicância, senão vejamos a ementa do julgado que segue:

HABEAS CORPUS - AÇÃO PENAL - DENÚNCIA FUNDAMENTADA EM SINDICÂNCIA MILITAR - DISPENSABILIDADE DO INQUÉRITO POLICIAL NO OFERECIMENTO DE DENÚNCIA POR SER PROCEDIMENTO MERAMENTE INFORMATIVO - CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CARACTERIZADO.[4]

Seguindo tal tendência, decidiu também o Colendo Superior Tribunal de Justiça, nos seguintes termos:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ART.319 DO CÓDIGO PENAL MILITAR. ALEGAÇÃO DE INÉPCIA DA DENÚNCIA. INOCORRÊNCIA.


DENÚNCIA OFERECIDA COM BASE EM SINDICÂNCIA. DISPENSABILIDADE DO INQUÉRITO POLICIAL. POSSIBILIDADE.

I - A peça acusatória deve conter a exposição do fato delituoso em toda a sua essência e com todas as suas circunstâncias. (HC 73.271/SP, Primeira Turma, Rel. Min. Celso de Mello, DJU de 04/09/1996). Denúncias genéricas, que não descrevem os fatos na sua devida conformação, não se coadunam com os postulados básicos do Estado de Direito. (HC 86.000/PE, Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJU de 02/02/2007). A inépcia da denúncia caracteriza situação configuradora de desrespeito estatal ao postulado do devido processo legal.
II - Na hipótese dos autos, tenho que a exordial acusatória descreve de maneira satisfatória fato, ao menos em tese, delituoso que se adequa ao tipo penal previsto no art. 319 do Código Penal Militar (prevaricação). Com efeito, narra a denúncia, objetivamente, que o denunciado teria deixado de praticar, indevidamente, ato de ofício, para satisfazer interesse pessoal, pois, segundo afiram a denúncia, "O Comandante em vez de tomar as providências legais, tendo em vista o visível crime de prevaricação praticado pelo subordinado, chamou-o em seu gabinete e pediu-lhe que redigisse outro documento modificando a versão original dos fatos, com a alegação de que daquela maneira se complicaria visto que seria aberto um procedimento para apurar o motivo pelo qual não havia sido o militar reformado encaminhado à Delegacia." (fl. 13). Assim, não há como se acolher a alegação de inépcia da proemial. De qualquer forma, as alegações trazidas pelo recorrente para fundamentar o pedido, neste ponto, demandam a análise aprofundada dos elementos constantes dos autos, inviável na via eleita, pois o que se pretende, em verdade, é a antecipação do mérito da ação penal, medida, à toda evidência, incabível, no caso.
III - A inépcia enseja, em regra, nulidade e não o trancamento da ação penal.
IV - O inquérito policial, por ser peça meramente informativa, não é pressuposto necessário para a propositura da ação penal, podendo essa ser embasada em outros elementos hábeis a formar a opinio delicti de seu titular (Precedentes desta Corte e do Pretório Excelso).[5] (grifamos)
  
Todos os fundamentos alhures ofertados sugerem que a questão está resolvida. A realidade, contudo, não é essa, posto que a prática de instaurar-se inquérito, apesar de existirem nos autos da sindicância fartos elementos probantes reveladores do crime e da sua autoria, ainda é muito comum no âmbito da Polícia Militar de Pernambuco. Tal realidade é preocupante porque constitui uma atividade claramente infrutífera, porquanto visa esclarecer fato que já foi esclarecido no processo administrativo disciplinar, sendo por isso inócua. Além disso, essa prática assoberba de trabalho os eventuais encarregados dos inquéritos e gera gastos desnecessários para a administração pública, ferindo assim o princípio constitucional da eficiência, estatuído no art. 37, caput, da Carta Política.

O postulado da eficiência consiste na capacidade de aptidão para obter um determinado efeito, lançando mão dos menores esforços possíveis, de modo que diz respeito tanto à otimização dos meios quanto a qualidade do agir final. Sobre ele, pondera Celso de Mello que “o administrador público esta compelido a agir tendo como parâmetro o melhor resultado estando atrelado ao princípio da proporcionalidade, o qual estará sujeito à aferição do controle jurisdicional.”[6]

CONCLUSÃO
A análise aprofundada da legislação, da doutrina e da jurisprudência revela a desnecessidade da instauração de inquérito policial militar quando em sindicância tiverem sido esclarecidas todas as circunstâncias relativas ao crime e sua autoria. Nessa hipótese, resta à autoria militar apenas remeter cópia dos autos do processo administrativo disciplinar ao representante do ministério público com atribuição para funcionar no caso, isso porque a persistência da solução comumente dada à questão representa um sério atentado ao princípio Magno da eficiência.





[1] TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 198.

[2] CAPEZ, Fernando, Curso de processo penal. 14.ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 72.
[3] STJ/6ª T., RHC 5.094-RS, rel. Min. Vicente Leal, DJU, 20 maio 1996, p. 16472.

[4] TJMS/2ª T., HC 12040 MS 2002.012040-5, rel. Des. Atapoã da Costa Feliz, DJU, 25 fevereiro 2003, p. 472.
[5] STJ/5ª T., RHC 22442 PA 2007/0273324-9, rel. Min. FELIX FISCHER, DJ 28.04.2008 p. 1.

[6] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 67.

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terça-feira, 2 de abril de 2013

AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO NO PROC DISC SUMARÍSSIMO


Ampla defesa e contraditório no procedimento disciplinar sumaríssimo

Cap PM Petrus Gomes Genuino


O presente trabalho tem objetivo esclarecer as autoridades competentes para aplicação de penas disciplinares descritas nos ditames do Art. 10 e 11 do CDME[1].
O Procedimento Disciplinar Sumaríssimo é espécie do gênero Processo Administrativo Disciplinar Militar, tal qual também o são o Conselho de Disciplina, Conselho de Justificação, Processo de Licenciamento e Sindicância acusatória.
Neste diapasão e apenas por amor ao debate e à técnica, em breve digressão, apontamos o que nos parece uma inexatidão no termo Procedimento, definido pelo Art. 2º Portaria do Comando Geral - 740 de 25 de out de 2000 - SUNOR nº 034[2], pois visto a partir da análise de sua forma verifica-se que o instrumento trata-se de um processo, dividido em fases, com prazos estabelecidos, decisão de autoridade competente e fase recursal, e ainda mais submetido aos direitos e garantias definidos na Carta Constituinte de 1988, dentre os quais citamos o Devido Processo Legal, Ampla Defesa e Contraditório.
Fato peculiar, e que é objeto da presente análise, é o tratamento dado pelo instrumento processual em lide à garantia da ampla defesa e contraditório.
A ampla defesa e o contraditório divide espaço com outras garantias, resultantes de longa evolução dos direitos e garantias individuais, em sua grande parte elencadas no Art. 5º da Constituição Federal.
Quando tratamos desses direitos é certo na doutrina e jurisprudência dominante não há hierarquia entre os direitos e garantias individuais.
Apenas para exemplificar citamos o exercício do direito à vida. De certo cada indivíduo pode usufruir de sua vida da maneira que melhor lhe aprouver, inclusive pairando a possibilidade de abrir mão desse direito, simplesmente optando por não exercê-lo, de sacrificar-se. Por outra banda, não se admite que o Estado, diante da cena de uma tentativa de suicídio, esquive-se da obrigação de impedir tal desgraça. Isso se deve ao princípio da indisponibilidade dos direitos individuais.
Fazendo um paralelo entre o direito à vida e o direito à ampla defesa e ao contraditório, não é aceitável que o Estado, observando que o indivíduo está prestes a sacrificar direito fundamental, togado de indisponibilidade, mantenha-se inerte e corroborando com o sacrifício jurídico. É por isso que não é juridicamente correto punir, mesmo o servidor, sem que este tenha exercido o direito à ampla defesa e ao contraditório como dispõe o legislador quando incluiu a seguinte redação do §7º do Art. 11 da Lei 11.817/00:
Lei 11817/00. Art. 11. §7º. O Comandante de OME, uma vez recebida a defesa escrita e provas do transgressor, ou cientificado, formalmente, da sua não-apresentação no prazo legal ou da recusa de ciência de notificação, dará solução a parte disciplinar no prazo máximo de 5 (cinco) dias úteis ( Grifos nossos)
Ainda por outro lado, a norma infralegal ainda dispõe através da Portaria nº 740, de 25 de outubro de 2000, publicada no SUNOR nº 034, em seu Art. 3º, § 3º:
“Transcorrido o prazo de 05 (cinco) dias úteis, a contar do recebimento da notificação ou da publicação da certidão de recusa do seu recebimento,apresentadas ou não as razões de defesa, o processo será submetido a apreciação do Comandante para a solução”.(grifo nosso)
A análise dos textos normativos acima referendados deixa clara a hipótese do servidor, processado na espécie Procedimento Disciplinar Sumaríssimo, ser punido sem que tenha exercido a ampla defesa e contraditório, o que ofende pacífico entendimento dos Tribunais brasileiros, a saber:
Polícia militar. Licenciamento. Mera investigação sumária dos fatos em que se envolveu o autor. Violação do princípio da garantia de defesa. Aplicação do art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal. [...] A Constituição vigente instituiu, em prol dos acusados em geral, a garantia do contraditório e da plenitude de defesa, com os meios e recurso e ela inerentes. Assim, qualquer ato punitivo da Administração com violação dessa garantia é visceralmente nulo. Dano moral - Inexistência de comprovação. Pedido que não merece acolhimento. 5º LV Constituição Federal. (579237 SC 1988.057923-7, Relator: Nestor Silveira, Data de Julgamento: 21/10/1993, 2ª Câm. de Direito Criminal, Data de Publicação: Apelação cível n. 40.289, da Capital.)

Existe para acalentar a problemática da hipótese demonstrada, qual seja: a do militar que não apresenta suas razões de defesa e o processo é encerrado sem qualquer instrumento de defesa. Nesta situação deve haver a subrogação do exercício constitucional através do defensor dativo, figura heróica no âmbito da regularidade processual administrativa.
A aplicação da pena, por sua vez, deve necessariamente preceder à estrita obediência dos mesmos princípios, normas e critérios do processo disciplinar sui generis.
Sendo assim, o Procedimento Disciplinar Sumaríssimo deverá obedecer aos princípios do contraditório e da ampla defesa, com a utilização dos meios e recursos a ela inerentes Neste sentido, diante da hipótese do servidor militar não apresentar suas razões de defesa, resta à administração nomear defensor dativo para redigir as razões de defesa em lugar do servidor, suprindo a lacuna processual demonstrada.




[1] LEI Nº 11.817, DE 24 DE JULHO DE 2000.
[2] Art. 2º - O procedimento administrativo disciplinar iniciado em decorrência de parte disciplinar, e que não implique em instauração de sindicância, chamar-se-á procedimento disciplinar sumaríssimo.

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